Carne de gado japonês conquista paladar da alta gastronomia e oferece chances para o pecuarista driblar a crise. Evento também sedia a Exposição Nacional da raça
Em meio à cidade de Tóquio, no Japão, restaurantes de diferentes províncias disputam carcaças campeãs em uma exposição que acontece a cada cinco anos, e chegam a desembolsar US$ 1.000,00 por apenas um quilo da carne do bovino nipônico, assunto que ganha na mídia local.
A primeira experiência dos brasileiros com a raça milenar ocorreu na década de 1990, com a importação de 200 embriões e 5.000 doses de sêmen dos Estados Unidos. Guardada a sete chaves, o mundo só conheceu o Wagyu depois de um acordo firmado entre Japão e Estados Unidos.
“No Brasil, um quilo do Kobe Beef, o contrafilé de Wagyu, pode custar R$ 600,00, dependendo do grau de marmoreio”, informa Daniel Steinbruch, proprietário da Fazenda Angélica e da marca Kobe Premium, em Americana (SP), presente em boutiques e restaurantes, principalmente, da capital paulista.
O jovem empresário investe na criação de gado nipônico há mais de uma década e seu objetivo é ampliar o plantel de 500 animais – o maior entre os criadores brasileiros – e, consequentemente, elevar a oferta de cortes especiais. Este é um mercado que caminha na contramão da crise econômica, crescendo 35% ao ano.
Steinbruch abate 150 animais por ano, mas tem a meta de aumentar este volume para 50 animais por mês. Para tanto, o jovem criador utiliza biotecnologias inovadoras como a Fertilização In Vitro (FIV) e apoia-se em parcerias para conseguir o volume de bovinos desejado.
Assumindo a compra dos bezerros das vacas comercializadas em seu leilão anual, ele paga seus fornecedores com até 2,2 vezes sobre o valor da arroba convencional do boi gordo. Em setembro, a 6ª edição do Leilão Kobe Premium contou com a presença de 500 pessoas, entre criadores, pesquisadores, profissionais e novos investidores. Foi a maior oferta da raça no ano.
O remate movimentou R$ 370 mil em poucas horas, com a venda de 24 lotes, sendo 20 fêmeas, 20 doses de sêmen, 1 touro e 1 garrote. O lote mais valorizado foi arrematado por R$ 26.400,00. O evento também foi palco da Exposição Nacional da Raça Wagyu, que reuniu 50 animais oriundos dos estados de São Paulo, Goiás e Minas Gerais e Rio Grande do Sul, muitos dos quais pertencentes a integrantes do programa de fomento criado pela Fazenda Angélica.
Foi neste evento que o empresário Átila Camilo de Godoi, da Fazenda Seikon, sediada no município
de Guaraí, também do interior paulista, ingressou na criação de Wagyu. “Os eventos promovidos pela Angélica oferecem muitas oportunidades de negócio, desde a entrada no mercado de genética até a participação no programa de fomento da raça”, atesta o criador.
No momento, o plantel de Godoi conta com 80 animais. O remate também atraiu criadores que também apostam em cortes de marca própria, como é o caso do Haras Rancho Tokarsky, de Brasília (DF), que trabalha com Wagyu cruzado com outras raças, ao contrário da Fazenda Angélica, que prefere abater exemplares puros e 30% mais valorizados.
A propriedade já criava outras raças de bovinos, ovinos, equinos e resolveu começar no Wagyu há dois anos, motivada pela experiência de seus proprietários ao consumir a carne. “O mercado sempre foi promissor para todas as raças, mas percebemos que havia um público seleto para oWagyu. Então, decidimos investir”, relembra a médica-veterinária da propriedade, Sara Soares Mendonça, ressaltando a qualidade da genética da Fazenda Angélica, de quem comprou seis doadoras de embriões.
“Os animais comercializados nos Leilões Kobe Premium são filhos das 15% melhores vacas apartadas todos os anos na Fazenda Angélica e com escore de marmoreio acima de 6%”, explica Steinbruch. Empreendedor nato, ele sabe que para obter o melhor produto Kobe Premium necessita repassar a melhor genética aos fornecedores.
O gado abatido pelo Haras Rancho Tokarsky, por exemplo, vai ao gancho com 19@ aos 35 meses, em média, com 55% de rendimento de carcaça, números superiores à média nacional.
Certificação Wagyu
O encontro na Fazenda Angélica também foi palco do lançamento de dois selos de certificação idealizados pela Associação Brasileira dos Criadores de Bovinos da Raça Wagyu, atendendo exigências de restaurantes como o Aizomê e o Tessen, em São Paulo (SP).
“Muitos restaurantes servem carne do Wagyu, mas sem exigem certificação. O que estamos fazendo é criar um elo entre produtor e restaurante, garantindo o fornecimento de uma carne 100% rastreada e certificada, seja de animais puros ou cruzados”, afirma George Gottheiner, presidente da Associação Brasileira dos Criadores da Raça Wagyu.
Pecuária japonesa na capital paulista
Gottheiner participou recentemente do Taste Of São Paulo, um dos principais festivais gastronômicos do mundo, e ao perguntar a um público de 80 pessoas quem sabia que o Wagyu também era criado no Brasil só uma levantou a mão, mesmo existindo uma gigantesca demanda por essa carne no Brasil.
“O segredo para atrair novos investidores e consumidores está no paladar, razão pela qual é importante participar de eventos gastronômicos”, disse o presidente da associação. O marmoreio tão apreciado na pecuária japonesa e brasileira exige do animal mais de 300 dias em confinamento.
Os elevados custos com a alimentação, entre outros insumos, exigem que o criador assuma total controle sobre a produção, razão pela qual Daniel deve inaugurar, no primeiro semestre de 2018, um entreposto de desossa, terceirizando o abate.“O porcionamento da carcaça é quase artesanal, exigindo máximo aproveitamento dos cortes”, explica Daniel.